CARLOS A. GRABOIS GADELHA*
Jornal do Brasil
A saúde é parte indissociável do desenvolvimento nacional. Além de constituir um direito essencial de cidadania, constitui uma fonte de geração de valor e de riqueza social e econômica. A saúde emprega diretamente 6,6 milhões de pessoas (IBGE), podendo mobilizar mais de 15 milhões de trabalhadores, pelos efeitos diretos e indiretos que possui no sistema produtivo. Não há nenhuma outra área comparável com esse potencial para tirar brasileiras e brasileiros da dramática situação de desemprego, subemprego ou de desalento com o seu futuro.
A saúde representa 9% do PIB, considerando as atividades industriais e de serviços que se articulam no Complexo Econômico-Industrial da Saúde. Mais de 30% da pesquisa nacional concentra-se na área da saúde, ocupando a liderança nacional na geração do conhecimento do futuro, base para uma inserção soberana e dinâmica do Brasil no mundo contemporâneo. Há uma clara convergência entre diferentes concepções de que saúde e inovação, pelas evidentes falhas de mercado existentes, requerem uma articulação entre o Estado e o setor produtivo para gerar círculos virtuosos de bem-estar e desenvolvimento.
Este potencial pode ser o vetor mais dinâmico da entrada do Brasil na quarta revolução tecnológica, que já constitui uma realidade global. A interconectividade das pessoas e das coisas, a inteligência artificial integrada ao uso de grandes bases de dados, a digitalização do mundo biológico, a impressão 3D, a nanotecnologia e uma saúde pública baseada em sistemas inteligentes e preditivos incorporam os desafios do futuro e conformam uma agenda crítica para a saúde no presente.
Uma atenção básica de qualidade, que permita o acesso universal, envolve conhecimento, criatividade e capacidade local de inovação. A atenção básica do futuro requer mais inteligência, uma abordagem multiprofissional e transdisciplinar e integração em rede, superando velhos paradigmas assistenciais. A humanização do cuidado e a inovação tecnológica e social podem ocorrer em um novo e mesmo processo, gerando acolhimento, cidadania, emprego, renda, investimento e conhecimento estratégico para o futuro.
Todavia, a transformação do conhecimento em riqueza social encontra-se restrita por termos uma base produtiva atrasada. Nossos cérebros e nossa ciência acabam gerando riqueza em países capazes de transformar conhecimento em inovação, levando a um insustentável e ineficiente déficit tecnológico anual em saúde de mais de R$ 50 bilhões.
A prioridade para o Complexo da Saúde representa uma forma contemporânea de ação sistêmica para pautar novas estratégias de desenvolvimento para as necessidades de nossa população e para os desafios do País. A produção e a inovação em saúde são bases essenciais para a garantia do acesso universal, para a estruturação de um SUS moderno e dinâmico, avaliado pelos usuários e calcado em uma atenção básica inteligente e resolutiva. Ao invés de escolha de setores, caminha-se para a seleção de problemas que devem ser enfrentados pela sociedade brasileira e que dependem de capacidade local de conhecimento e inovação.
Esta concepção possui possibilidades concretas, com exemplos destacados na história brasileira. Recentemente, o risco de epidemia de Febre Amarela foi evitado pela base tecnológica construída na Fiocruz. Há investimentos importantes que mobilizam o Estado e o setor produtivo para viabilizar o tratamento de câncer, entre outras doenças, superando monopólios existentes na área, que tornam a saúde brasileira vulnerável.
Saúde é uma base para a superação da crise e para a construção de consensos possíveis em torno de uma estratégia nacional de desenvolvimento que alie o bem-estar, o acesso universal e a inovação. É uma oportunidade que está ao alcance de nossas mãos.
* Coordenador das Ações de Prospecção da Presidência da Fiocruz
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