O presidente Paulinho esteve presente no primeiro dia do XI Seminário Internacional de Direitos Humanos e Saúde e do XV Seminário Nacional de Direitos Humanos e Saúde, nesta segunda-feira (25/11).
Ele, que é professor pesquisador do Departamento de Direitos Humanos e Saúde (Dihs) da ENSP, compôs a mesa de abertura do evento, que teve como tema “O presente e o futuro dos Direitos Humanos: saúde das populações diante da mudança climática”.
Paulinho destacou a presença do ativista indígena Ailton Krenak no seminário e ressaltou a importância da Asfoc e de outras entidades sindicais tratarem da questão climática como um tema a ser discutido abertamente.
Confira a fala na íntegra do presidente Paulinho:
"Senhoras e senhores, companheiros, companheiras, colegas.
É com muita alegria que nos reunimos hoje para discutir "O Presente e o Futuro dos Direitos Humanos: Saúde das Populações Diante da Mudança Climática". Estamos alegres porque estamos materializando um evento que é fruto de muita reflexão e trabalho. É uma vitória, claro. Mas também nos reunimos justamente porque é preciso compartilhar preocupações e responsabilidades que precisam tomar a forma de ação, e urgentemente.
Conta o nosso querido e ilustre palestrante, Ailton Krenak, que devemos aprender a "adiar o fim do mundo". Esse adiamento só é possível repensando e configurando de modo radical de nossos valores e práticas. Nosso planeta enfrenta crises que já desafiam a sobrevivência humana, com a saúde das populações cada vez mais ameaçada por desequilíbrios ambientais, desigualdade social e retrocessos democráticos.
Mas, ao contrário de tantas vozes diferentes da de Krenak, não repetirei que o fim do mundo é ira divina, nem castigo para pecadores, nem capricho da mãe natureza.
Não.
Minha voz quer ouvir mais da voz de Krenak. Eu quero ouvir essa voz, que ouve a voz da floresta, que ouve a voz da água, a voz do sol, das flores e das feras. Juntas, essas vozes, a dele, a minha, das flores e das feras e a de vocês, de nós e de tudo junto, sabemos que, se existe o apocalipse, ele é feito de um cavaleiro apenas: a voracidade neoliberal.
Tragédias como as queimadas na Amazônia, as enchentes no Rio Grande do Sul e os desastres de Mariana e Brumadinho não são ira divina que ceifa vidas, mas o atestado de negligência sistêmica que prioriza o lucro em detrimento do bem-estar coletivo.
O apocalipse nasce de transformar direitos em mercadorias, de apartar homens, mulheres, raças e espécies de toda e qualquer relação equilibrada com a Terra. Este rompimento é a base do modelo que devastou ecossistemas e ignorou populações vulneráveis. Este modelo de crescimento autofágico e insustentável não pode ser chamado de desenvolvimento.
Por isso mesmo, há poucos dias apenas, o G20 Social lançou um grito global por inclusão e democracia. Inspirados por essa agenda, reafirmamos a urgência de um modelo de desenvolvimento que priorize o bem-estar humano e ambiental.
Precisamos construir uma convivência respeitosa com a Terra, reconhecendo-a como parceira de existência. A saúde humana, animal e ambiental são inseparáveis. A luta pela saúde das populações não pode estar desconectada da luta pela justiça climática e pela proteção dos biomas. É fundamental que articulemos uma agenda integrada que combine justiça social, saúde e sustentabilidade. A justiça fiscal deve ser a pedra angular desse modelo, combatendo a evasão de impostos e redirecionando recursos das grandes corporações para serviços públicos essenciais.
Recentemente, tive a oportunidade de aprender muito participando do Comitê de Meio Ambiente, Transição Justa e Mudanças Climáticas, da Internacional de Serviços Públicos (ISP), que é o sindicato global da qual a Asfoc faz parte. Discutimos a necessidade dos sindicatos e das instituições públicas se apropriarem desta temática, realizarem articulações para ocupar esse espaço com objetivo de construir alternativas para solução e prevenção de desastres ambientais.
Semana passada aprendi um pouco mais, pois a ISP promoveu sua 13º Conferência Regional Interamericana (IAMRECON) com mais de 400 sindicalistas. Este encontro resultou num Programa de Ação Regional 2024-2029 para as Américas, sob o lema "O povo acima do lucro com paz, democracia e justiça social". Entre as prioridades do programa estão a promoção de trabalho decente, a defesa de serviços públicos universais e de qualidade, essenciais para reduzir as desigualdades sociais, e o enfrentamento da crise climática como uma questão transversal que impacta diretamente os direitos das populações.
A mudança climática não éapenas uma questão ambiental. A pandemia de COVID-19 nos ensinou lições duríssimas sobre os desequilíbrios em ecossistemas e sobre sistemas de saúde precarizados. Contudo, ela também revelou a resiliência e a recuperação da natureza deixada tranquila, e a força das redes públicas e comunitárias, mostrando que apenas um estado democrático robusto pode garantir a equidade em tempos de crise. O Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos maiores avanços civilizatórios do Brasil, consagrando a saúde como um direito de todos e um dever do Estado. Ele garante acesso universal e gratuito à saúde, essencial na luta contra as desigualdades que persistem.
Esta é uma oportunidade crucial para refletirmos sobre a importância do SUS em um momento em que a saúde das populações enfrenta ameaças significativas. Sabemos que não é possível construir um SUS forte sem trabalhadores E vice-versa, pois o SUS não é um fim em si mesmo; ele é parte de uma luta maior por equidade, reparação histórica e justiça social. É imperativo que nos coloquemos na linha de frente da defesa da ciência pública e da tecnologia acessível, lembrando que as ameaças que enfrentamos não são apenas conjunturais, mas estruturais.
Assim, é preciso reafirmar o papel dos sindicatos não apenas como defensores das boas condições de trabalho, mas como atores na luta mais ampla por reparação histórica, equidade de gênero, enfrentamento do racismo e a promoção de um desenvolvimento sustentável e inclusivo. Nosso papel, enquanto entidade representativa, é ampliar a articulação com outros movimentos sociais e organizações, alinhando nossas pautas a um projeto mais amplo de sociedade, como sinaliza a ISP em sua estratégia para os próximos anos.
Ao celebrarmos este momento importante, renovamos nosso compromisso com uma agenda que priorize a dignidade humana e os direitos coletivos. Que possamos sair deste seminário mais preparados para enfrentar os desafios do presente e construir um futuro onde todos tenham acesso à saúde, educação e dignidade.
Que este seminário acenda em nós a vontade de ser parte de um movimento global em defesa dos direitos humanos e da justiça social. É fundamental que daqui saiam não apenas análises críticas, mas propostas concretas que fortaleçam nossa luta coletiva. A história da ENSP nos ensina que a transformação social só é possível quando unimos pensamento e ação, ciência e militância, solidariedade e mobilização.
Sejam todos e todas muito bem-vindos e bem-vindas. Obrigado!
Muito obrigado!"