"O povo acima do lucro com paz, democracia e justiça social". Este foi o tema da 13ª Conferência Regional Interamericana (IAMRECON), promovida pela Internacional de Serviços Públicos (ISP), realizada entre os dias 10 e 14 de novembro de 2024, em Bogotá, na Colômbia. Dois diretores delegados e uma diretora convidada da Asfoc se juntaram a outros 400 líderes sindicais, representantes governamentais e aliados estratégicos presentes ao evento.
A necessidade de construir políticas nacionais que possam ser integradas regionalmente para atender às especificidades locais por meio de esforços conjuntos e cooperação bilateral e multilateral foi reforçada por diversos países presentes. O Brasil teve papel relevante na conferência, com uma delegação ampla e ativa. Sindicalistas brasileiros defenderam a ampliação da justiça fiscal para garantir o financiamento de serviços públicos e abordaram o impacto das políticas neoliberais no aumento da desigualdade.
Saúde como prioridade regional
Os debates sobre o setor de Saúde ganharam destaque no evento, reconhecendo a importância de manter e expandir sistemas públicos universais. O Brasil também trouxe à pauta a necessidade de articulação entre trabalhadores urbanos e rurais, especialmente necessária no setor de saneamento básico e saúde, em que os desafios são agravados pela precarização ou total falta de infraestrutura. Exemplos de resistência contra a privatização de serviços essenciais foram citados, com destaque para o Sistema Único de Saúde (SUS).
Paulo Garrido, presidente da Asfoc, e outros sindicalistas defenderam que é essencial aumentar o financiamento público e combater a terceirização e a precarização nos serviços públicos, de modo geral, e na saúde, em especial. A Union of Public Employees (CUPE), do Canadá - país que também tem um sistema único de saúde - destacou que sistemas de cuidado e saúde financiados e geridos publicamente são os únicos realmente capazes de garantir direitos tanto de trabalhadores quanto de usuários em pandemias, guerras e desequilíbrios ambientais, entre outras emergências.
Na visão do presidente da Asfoc, a pandemia de COVID-19 e outras epidemias expuseram fragilidades significativas, evidenciando a precariedade das condições laborais em saúde e os impactos da privatização, ao mesmo tempo que deixou claro que apenas os serviços públicos podem garantir o acesso universal à saúde como direito humano fundamental. Ele também lembrou da atuação da Asfoc nas ruas e no Congresso durante a pandemia, e em entidades de luta pelos direitos das vítimas da Covid-19 e de seus familiares, como a Vida e Justiça.
“O capital simplesmente não trabalha na lógica da saúde como direito humano”, afirmou Garrido, que participou do Comitê de Meio Ambiente, Transição Justa e Mudanças Climáticas da ISP e, na Fiocruz, integra o Departamento de Direitos Humanos e Saúde - DIHS, na ENSP. “Agora, ainda em novembro, teremos os desdobramentos de um seminário internacional do DIHS com foco na saúde das populações diante da mudança climática. É urgente que sindicatos e instituições públicas como a Fiocruz construam alternativas para solução e prevenção de riscos de grande escala que são, na verdade, frutos de neoliberalismos e fundamentalismos”.
Comitês: Asfoc engajada
No âmbito do Comitê do Combate do Racismo, à Xenofobia e a todas as formas de discriminação, a diretora de Assuntos Jurídicos da Asfoc, Mychelle Alves, sugeriu uma formação em letramento racial, aberta a diferentes públicos. "O que a gente vê nos ados apresentados pela ISP sobre a luta contra o racismo em países das Américas é que falta avançar muito, e não só no Brasil". Para ela, não se trata só de desconhecimento, mas também de escala: lideranças no sindicalismo e noutras frentes de organização social e política, brancas ou não, poderiam se beneficiar do letramento. "A luta contra o preconceito não pode estar restrita a quem é alvo dele", apontou.
Quanto ao Comitê das Mulheres, a ISP Brasil está com a campanha pela ratificação da Convenção da OIT-190, para acabar com o assédio moral e sexual e todas as formas de violência no serviço público. Alguns países que já ratificaram a convenção foram ouvidos sobre suas estratégias de erradicação. Além desta, outra campanha internacional, que busca reconhecimento e valorização do cuidado como forma de trabalho, deverá ter colaboração da Asfoc, segundo Alves. "Tanto as violências e os assédios no trabalho como o peso da responsabilidade e da invisibilidade de cuidar são vividos em sua franca maioria pelas mulheres, e no Brasil não é diferente.”
Convidada para o evento, a diretora de Comunicação da Asfoc, Luiza Silva, propôs um Comitê de Comunicação. Segundo ela, o comitê - aprovado por unanimidade no evento - não se confunde com a comunicação institucional da ISP. "Vamos buscar tanto as potências como as dores reconhecíveis nos comitês brasileiros que possam ser tratadas como prioridades de comunicação". Essa sinergia pode economizar tempo e recursos para reforçar e amplificar mensagens-chave, combater fake news e reduzir ruídos”. Na Saúde, Silva deverá colaborar com a sistematização da temática de Risco e Crise - sua área de atuação acadêmica.
Um futuro justo para o serviço público
As transformações políticas na América Latina e no Mundo e seus efeitos sobre direitos sindicais e as negociações coletivas foram debatidas no evento da ISP, mapeando prioridades e estratégias para a nova luta sindical. Um plano de ação para os próximos cinco anos, priorizando a verdadeira justiça fiscal e o combate às privatizações, à justiça fiscal, e a defesa do acesso universal a serviços públicos de qualidade e do uso de recursos naturais e energéticos como direitos sociais e humanos.
Como estratégia, o IAMRECON preconiza um esforço de comunicação e informação para desconstruir o avanço do discurso neoliberal de cortes nas contas públicas, e a união regional para o fortalecimento sindical. O evento ofereceu como solução de sustentabilidade para a criação, a manutenção e a expansão de estruturas e de efetivos qualificados para os serviços públicos - tanto na saúde como em frentes fundamentais, como energia, água, previdência, entre outras - uma transformação profunda no cenário fiscal global, combatendo as evasões fiscais e os subsídios bilionários a grandes corporações para garantir a sustentabilidade.
“São ações que já nascem com a ótica de direitos e de sustentabilidade, muito afinados com a nossa diretoria, tanto nos movimentos sociais, nos conselhos setoriais e em grandes fóruns nacionais e internacionais. Converge com as ações da Asfoc no G20, converge com nosso alinhamento à Agenda 2030. Mas têm implicações diretas também nas negociações salariais, porque a essência da ISP é valorizar o servidor público”, ponderou o presidente da Asfoc.
Paulinho lembrou que a Asfoc segue na batalha para que todos os trabalhadores da Fiocruz recebam ainda em janeiro as reposições salariais e benefícios como o RRA e o APH. “Uma lei que garanta a negociação coletiva e a data-base levando em conta o valor do serviço público, independentemente de representação por setor, federação ou confederação, transformaria radicalmente a negociação coletiva em curso”, aponta. Para ele, a integração com a ISP dá outra escala, mas também "clareza e consistência à pressão sindical, já que todas as pautas estão diretamente ligadas à valorização das carreiras públicas e das funções estratégicas de estado.”